As Teorias
das Relações Internacionais são instrumentos teórico-conceituais por
meio dos quais podemos compreender e explicar os fenômenos relativos à ação
humana que transcende o espaço interno dos Estados, ou seja, que tem lugar no
meio “internacional”. Teorias costumam ter a intenção de tornar o mundo
mais compreensível para seus interlocutores, e em alguns casos de explicar e
desenvolver possíveis previsões para o futuro. É lícito falar, nas relações
internacionais, de teorias positivistas, isto é, que acreditam em verdades
universais e científicas, e de teorias pós-positivistas, ou seja, aquelas que
duvidam da legitimidade do conhecimento científico e contestam as bases
epistemológicas, metodológicas e teóricas dos discursos dominantes. Podemos
ainda falar em meta-teorias, como algumas faces do construtivismo. O realismo
e o neo-realismo são as correntes dominantes de pensamento nas
relações internacionais ainda hoje embora possamos falar em descentralização e
fragmentação no campo.
Realismo e Neo-realismo
A rigor, não
se pode falar em origem das relações internacionais nem em teorias
absolutamente homogêneas. Tradicionalmente, porém, se considera que o primeiro
esforço sistematizado em pensar as relações internacionais ocorreu em 1917 com
a fundação na Escócia do primeiro departamento de Relações Internacionais da
história. Pensando numa forma de evitar os males da guerra (tendo em vista os
desastres da Primeira Guerra Mundial) os cientistas dessa escola debateram
formas de normatizar as relações internacionais. Na véspera do início da
Segunda Guerra Mundial, contudo, um estudioso chamado Edward Carr criticou pela
primeira vez os postulados desses primeiros cientistas em seu livro Vinte
Anos de Crise, denominando-os como idealistas, por pensarem o mundo na
forma como ele deveria ser ao invés de pensarem o mundo como ele efetivamente
era. O realismo se define, sobretudo, baseado na oposição de
Carr aos idealistas, ou seja, como uma teoria que vê o mundo da
forma como ele realmente é, desvinculado de princípios morais. Não obstante, a
expressão mais consolidada do realismo toma forma apenas após a Segunda Guerra
Mundial, com a publicação do livro Política Entre as Nações de
Hans Morgenthau. Com as mudanças no campo das ciências humanas e a
transformação do meio internacional (guerra fria e degelo, expansão das
organizações internacionais e aceleração do processo de globalização, etc.),
muitos autores, realistas ou não, começaram a criticar e rever a obra de
Morgenthau, oferecendo visões muito diversas de realismo, como o realismo
estruturalista de Kenneth Waltz, cuja obra Teoria Da Política
Internacional, de 1979, teve um impacto profundo nas ciências políticas...
Conceitos Realistas
Os realistas partilham
algumas características que permitem que muitos autores os reúnam em um só
grupo teórico. Nas teorias realistas das relações internacionais, que
reivindicam um caráter objetivo, empírico e pragmático, o Estado é
colocado no centro das discussões, pois se considera que o Estado é o ator
principal das relações internacionais. Esse Estado sempre atua servindo ao interesse
nacional, que em sua forma mais básica é o desejo de sobreviver, mas que
também se traduz no acumulo e na manutenção do poder. O poder é
tido como um instrumento por meio do qual os Estados garantem sua sobrevivência
no meio internacional, este último considerado, de acordo com os realistas,
como anárquico, isto é, na ausência completa de ordem. Os realistas não se
preocupam com a origem histórica dos Estados, mas os tomam como dados
(“naturais”), além de homogêneos, e geralmente pensam a natureza humana de
formapessimista, reivindicando como base de suas idéias as obras de Maquiavel, Hobbes e
até mesmo Tucídides. Nas ciências sociais, e também para os realistas, o Estado deve
ser definido a partir de sua capacidade de monopolizar a força coercitiva, ou
seja, o poder interno sem o qual não há ordem. No plano internacional, contudo,
não há “Estado” e, portanto, não há monopólio do poder coercitivo, resultando
disso os conflitos e guerras em que mergulha a humanidade freqüentemente. Dessa
forma, o âmbito internacional é perigoso, e os Estados devem pensar em
estratégias de segurança para impedir que sua soberania (autoridade
legítima de cada Estado sobre seu território e sua população) seja ameaçada, e
para assegurar sua sobrevivência. Encontramos essa descrição dos fenômenos
políticos em Hobbes, que caracteriza a sociedade sem Estados como uma disputa
constante de todos contra todos. Muitas vezes os Estados são obrigados a
cooperar e fazer alianças para sobreviverem, sobretudo em função de um equilíbrio
de poder, isto é, buscando manter um equilíbrio na distribuição de poder no
plano internacional. Logo, se um estado se torna muito poderoso, os outros
podem formar um bloco para neutralizar seu poder e reduzir seu perigo para a
segurança de cada nação. No pensamento realista a ética ocupa espaço reduzido,
uma vez que, buscando a sobrevivência, os Estados podem quebrar qualquer acordo
e desobedecer qualquer regra moral. A Realpolitik, do alemão
“Política Real”, prática da política externa definida como maquiavélica, é
normalmente associada a esse pensamento de cunho realista. Auto-ajuda é,
para os realistas, a noção de que os Estados só podem contar com a sua própria
capacidade no que diz respeito às relações internacionais. Em suma, os
realistas enxergam o sistema internacional como um espaço de disputa pelo
poder, motivada por um tema saliente em suas exposições: a segurança.
Hans Morgenthau
Hans
Morgenthau, o pai do realismo clássico, circunscreveu alguns
princípios que, em sua concepção, orientavam a política externa. Para ele, a
natureza humana era a referência básica de qualquer análise política, os
Estados tinham como objetivo comum a busca pelo poder e a moralidade seria
limitada e definida em termos particulares (ver: seis princípios do realismo
político3 ).
O objetivo supremo de todo o Estado seria a sobrevivência e o poder seria
instrumentalizado para servir aos interesses nacionais.O prestígio poderia ser,
também, um objetivo dos Estados no sistema internacional.4
John Herz
Contemporâneo
de Morgenthau, John Herz trouxe importantes
contribuições para o pensamento realista clássico. Embora partilhasse com
Morgenthau grande parte do núcleo da teoria realista, Herz admitia que a ética
tivesse um papel importante dentro das relações internacionais. Além disso,
Herz introduziu no pensamento realista a idéia de dilema de segurança: quando
um Estado se sente ameaçado, ele investe em armas, o que faz, em determinado
prazo, com que os Estados ao seu redor se sintam igualmente ameaçados, de forma
que eles também investem em armamentos. Dessa forma, todos os Estados acabam
numa situação pior do que antes em termos de segurança, mesmo que o objetivo
original de determinado Estado tenha sido o de aumentar sua segurança.
Liberalismo/
Pluralismo
Nas relações internacionais o Liberalismo, ou Pluralismo, é uma corrente
teórica alicerçada principalmente na obra de Immanuel Kant. Normalmente
considerados como “idealistas” pelos expoentes das escolas realistas, os
liberais tem uma visão predominantemente positiva da natureza humana, e vêem o
Estado como um mal necessário. Para os liberais, as relações internacionais
podem envolver cooperação e paz, possibilitando o crescimento do comércio livre
e a expansão dos direitos universais dos homens. Os liberais enfatizam as
relações internacionais como um palco em que atua uma multiplicidade de
personagens, como os Estados, as organizações internacionais, as empresas
transnacionais e os indivíduos, motivo pelo qual são chamados também de
pluralistas. Eles acreditam que as relações internacionais podem assumir um
aspecto mais otimista e sem guerras, motivado basicamente pelo livre comércio.
Conceitos Liberais
Embora os liberais tendam
a concordar com os realistas no que diz respeito à caracterização do sistema
internacional como anárquico, suas teorias normalmente enfatizam os aspectos
desse sistema que privilegiam a paz e a cooperação.
Para os teóricos do liberalismo, herdeiros do iluminismo de Kant,Montesquieu e
do liberalismo de Adam Smith, a guerra seria desfavorável ao
desenvolvimento do livre-comércio, de forma que o crescimento do comércio em
escala internacional favoreceria a instauração de uma era de paz e cooperação
nas relações internacionais. Um conceito particularmente importante
desenvolvido pelos liberais é o de interdependência. Num mundo cada
vez mais integrado economicamente, conflitos em determinadas regiões ou tomadas
de decisões egoístas poderiam afetar mesmo Estados distantes, a despeito de
seus interesses. A crise do petróleo é um exemplo de impacto da
interdependência. Nesse caso, os Estados tenderiam a cooperar visando evitar
situações desastrosas para a economia. A idéia de paz democrática também
é muito importante para as relações internacionais hoje. Ela se funda na idéia
Kantiana de que Estados com regimes em que prevalece a opinião pública não
entrariam em guerra entre si. A opinião pública alteraria os interesses dos
Estados, colocando em pauta questões que interessam aos indivíduos, como
liberdades, bem-estar social e outras questões de natureza
moral.5
Direito Internacional e Instituições
Entre os instrumentos preconizados pelos pensadores liberais como forma
de regular os conflitos internacionais estão o direito internacional e
as instâncias supranacionais. Hugo Grotius,
em seu Sobre o direito da guerra e da paz, foi o primeiro a
formular um direito internacional, pensando em princípios morais universais
(derivados do “Direito Natural”) alcançados por intermédio da razão que cada
homem detém. Grotius desenvolveu a idéia de Guerra Justa, isto é, que
existem circunstâncias em que a guerra pode ter legitimidade no direito. O
iluminista Immanuel Kant, por sua vez, pensava que a
formação de uma Federação de Estados refletindo princípios de direito positivo
seria a melhor forma de conter as guerras que assolavam a humanidade. Esses
dois elementos, o direito e a instituição internacional,
são tidos como formas eficientes e legítimas de assegurar a resolução de
conflitos sem o uso da força. Certamente inspiradas pelo pensamento kantiano,
uma série de entidades supranacionais foram criadas durante o século XIX, como
as entidades de cooperação técnica e outras de conteúdo mais explicitamente
político, como o Concerto Europeu.
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